Carla e João preparavam ontem à pressa o almoço ao som do kizomba que vinha da casa da vizinha, mas que bastava para animar o humilde T1, onde o casal vive com três filhos. Na sertã o chefe de família mexe três ovos a que junta uma lata de salsichas. Na mesa já está um pacote de batatas fritas e os três pequenos de garfo em riste. É o almoço para os cinco lá de casa. "Temos de comer à medida do possível para dar também para o jantar", explicava João.
Este agregado de ascendência cabo-verdiana está entre as mais de cem famílias identificadas como casos de pobreza extrema a residirem no problemático Vale da Amoreira (Moita), que além de não terem dinheiro para comer, também deixaram de pagar as prestações das suas casas. A freguesia é habitada por cerca de 16 mil pessoas, sendo que a taxa de desemprego já ascende aos 55%, consequência directa do encerramento de algumas unidades fabris no sector metalúrgico e componentes auto no distrito de Setúbal.
Já quanto aos jovens à procura do primeiro emprego que não encontram saídas profissionais, o número de desocupados ascende aos 60%, o que ajudará a explicar a elevada propensão para enveredarem no mundo do crime.
Tanto Carla como João já se encontram desempregados há tempo suficiente para terem perdido a vergonha de assumirem que estão a passar "grandes dificuldades". Até ao ano passado ainda foram escondendo o possível, mas acabaram a pedir ajuda quando deixaram de ter leite para dar aos filhos, confessa a mãe das crianças, uma antiga empregada de balcão que há mais de dois anos perdeu o emprego, quando a loja onde trabalhava fechou, garantindo que apesar dos tenros 34 anos já perdeu a esperança de dar um novo rumo à vida...
in JN 21/02/2009
